janeiro 20, 2005

O Príncipe e a BBC

Dois escândalos mediáticos sacudiram nestes dias a opinião pública britânica. As fotos do Príncipe Harry numa festa privada disfarçado de oficial do Afrika Korps, com a suástica nazi na manga, causaram agitação na classe política, críticas na imprensa e tumultos nos grupos judeus. Nesses mesmos dias, a decisão da cadeia pública de televisão, BBC, de emitir o musical “Jerry Springer – The Opera”, com piadas de mau gosto em relação a Jesus Cristo e uma linguagem obscena, provocaram uma inundação de críticas de grupos cristãos, manifestações de ruas em frente à sede da BBC e milhares de queixas por escrito.

Mas os protagonistas de ambos os casos reagiram de modo bem distinto. O Príncipe Harry desculpou-se através de uma nota pública. A BBC afirmou que manteria a emissão do musical sem “censuras”, ainda que reconheça que “ultrapassa os limites” e que não será do agrado de alguns.

Os comentários da imprensa perante os protestos dos grupos ofendidos foram também díspares. Os editores rivalizaram na dureza nas suas críticas contra o Príncipe Harry, de 20 anos, fustigando a sua falta de juízo e a ligeireza intolerável que o levaram a actuar como o “idiota com pior gosto do país” (The Times). As reacções em relação à BBC foram muito mais ligeiras, sem que tenha faltado os que defendem a emissão do musical em nome da liberdade de expressão por muito que incomode “grupos extremistas cristãos”. Neste caso, parece que o perigo provém não do que causa ofensa mas sim do que se sente ofendido.

Este duplo padrão não responde à diferente entidade de ambos os casos. O Príncipe disfarçou-se para uma festa privada, sem pretender que a sua “originalidade” transcendesse o público; a BBC transforma numa emissão pública, financiada por todos os espectadores, um musical, que até agora só se tinha apresentado numa sala de teatro para quem pretendesse pagar bilhete. A BBC tira relevo ao assunto aduzindo o carácter humorístico e satírico do musical; mas quase ninguém desculpa o Príncipe por se tratar apenas de uma “infantilidade” numa festa de disfarces.

Ao Príncipe recrimina-se que não tenha em conta as odiosas conotações da suástica, com um acto que “demonstra insensibilidade para com as vítimas dos nazis”, tanto judeus como soldados britânicos. Por outro lado, as burlas para com um judeu crucificado admitem-se para que a liberdade de expressão não seja vítima dos extremistas.

Mas não se trata apenas de problema de insensibilidade. Com uma ponta de exagero, diz-se que o disfarce nazi do Príncipe pode dar asas a alguns grupos anti semitas e radicais que ainda perduram no mundo de hoje. Mas, para justificar a emissão da BBC, alude-se ao facto de que uma cadeia pública deve reflectir “toda a sociedade” e levar a uma ampla audiência o que até agora estava confinado a salas de teatro.

Todo o mundo compreende que o disfarce de Harry ofendeu a comunidade judaica; no caso do musical da BBC, a questão muda de figura: segundo Terry Anderson, porta-voz da National Secular Society, “os espectadores têm direito a ver e quem se ofende tem igual direito a apagar o televisor”. Do mesmo modo, poderia dizer que os leitores do Sun têm direito a ver as fotos de Harry e os que se sintam incomodados podem não o comprar.

Para a próxima festa de disfarces o Príncipe deve ter um critério bem mais claro: é melhor que se vista de Herodes.

CT

7 comentários:

Anónimo disse...

Caro Tavares

Já viste o musical em questão? Em que te baseias para qualificar as alegadas piadas como sendo de mau gosto? E que autoridade moral têm os tais "grupos cristãos" para se idignarem? Serão saudades do bons velhos tempos da Santa Inquisição? Seguramente que seria muito mais confortável para os tais "cristãos ofendidos" que as suas verdades insofismáveis que eles pretendem ser universais não pudessem ser alvo de qualquer "atentado despudorado desse bando de ateus" feito através do humor.Seja neste ou noutro caso qualquer. O que está aqui em causa vai muito para além da defesa deste musical em particular... Tem antes a ver com a postura de intolerância da Igreja, escondida por detrás de uma retórica que apregoa exactamente o contrário. Foi assim em muitas outras situações. Ainda hoje filmes como "A Vida de Brian" dos Monty Python continuam censurados nalguns países (como a Irlanda, por exemplo), seguramente em defesa "do bom gosto". Talvez os tais grupos cristão devessem em primeiro lugar olhar para si próprios antes de fazerem juízos de valor sobre os outros que é o que as religiões instituidas têm feito ao longo da sua história. Uma história cheia de infiéis, guerras santas, fatwas, inquisições, talibans, e discursos inflamados contra todas as manifestações de discordância ou divergência, que colocam em causa, nas suas mentes distorcidas, a sua verdade...
Jorge Lourenço

Anónimo disse...

Caro Carlos
Com o devido respeito à família real inglesa, eu ignorei essa parte do post porque, muito sinceramente, estou-me nas tintas para o príncipe herdeiro. De facto não vi, nem faço questão de ver o referido musical. Nem tão pouco me interessa a sua qualidade. Não faço tenções de me armar em paladino da defesa desse espectáculo em particular. O meu comentário apenas procura por em evidência o ridículo das posições dos "Cristão ofendidos". O resto do post é meramente acessório. Agora convenhamos que aparecer um JC a dizer que é meio gay não me parece motivo para grandes alaridos... (embora já tenha percebido à luz da tua visão homofóbica isso seja uma grande ofensa...) Eu prefiro pensar em cada homossexual como menos um concorrente... Verdadeira ofensa seria JC aparecer nesse musical com uma camisola do benfica...mas isso ambos sabemos ser impossível porque hoje em dia já ninguém sabe o que é o benfica...
Jorge Lourenço

Anónimo disse...

Aqui vou fazer copy / paste dos meu comentários lá do teu blog:"diz-se que o disfarce nazi do Príncipe pode dar asas a alguns grupos anti semitas e radicais que ainda perduram no mundo de hoje." com tanto exagero que rodeia esta noticia, eu até acrescentaria que pode bem desencadear a 3ª Guerra Mundial. Simbolos são simbolos, actos são actos e esses é que se devem reprovar. A suástica apenas a vejo como um simbolo religioso muito anterior ao nazismo.“demonstra insensibilidade para com as vítimas dos nazis”, tanto judeus - Passo-me com falsos moralismos. Nâo tenho nada contra nem a favor dos judeus, mas que são um povo que valha-me Deus! Esta defesa só pode ser porque uma boa parte da economia mundial está nas mãos deles, só pode. Se formos a falar de vitimas, o genocidio no Ruanda foi bem maior que o Holocausto, e no entanto tudo se esteve a marimbar lá com os pretos. Portanto continuo a dizer que é contra os actos que as pessoas se devem insurgir.

Anónimo disse...

Claro que os pretos para além de não contribuirem em nada para a economia mundial, ainda lhes lixam as reservas de arroz quando são assolados pelas secas. Viva mas é o humor, as festas de fantasias e fantasmas para trás das costas. Eu no Carnaval vou-me mascarar de Jesus vou despertar nos jovens o amor e o mundo inteiro vai ficar bonzinho

Anónimo disse...

Cara Yulunga
plenamente de acordo no que se refere à condenação dos actos, mais do que sobre quem são praticados. E a juntar ao genocídio do Ruanda, eu acrescentaria os milhões de mortos na antiga União Soviética ( e não foi só no tempo do zé Estalin), no Cambodja do Pol Pot, na China de Mao Tse Tung, e em muitos outros paísese e/ou regiões, que alguns, certamente de forma pouco inocente, querem ignorar e apagar da história. Mas cuidado com as generalizações. Essa afirmação de que os Judeus são um povo que valha-nos Deus é perigosamente generalista...
Gostei da tua ideia para o disfarce de Carnaval... mas não tenho a certeza de que agrade muito ao Carlos Tavares a ideia de um JC "travestido". Ainda és capaz de acicatar os ânimos de algum grupo de "Cristãos ofendidos".
Jorge Lourenço

Anónimo disse...

Cara Yulunga
plenamente de acordo no que se refere à condenação dos actos, mais do que sobre quem são praticados. E a juntar ao genocídio do Ruanda, eu acrescentaria os milhões de mortos na antiga União Soviética ( e não foi só no tempo do zé Estalin), no Cambodja do Pol Pot, na China de Mao Tse Tung, e em muitos outros paísese e/ou regiões, que alguns, certamente de forma pouco inocente, querem ignorar e apagar da história. Mas cuidado com as generalizações. Essa afirmação de que os Judeus são um povo que valha-nos Deus é perigosamente generalista...
Gostei da tua ideia para o disfarce de Carnaval... mas não tenho a certeza de que agrade muito ao Carlos Tavares a ideia de um JC "travestido". Ainda és capaz de acicatar os ânimos de algum grupo de "Cristãos ofendidos".
Jorge Lourenço

Anónimo disse...

Carlinhos,
Imagino que com essa do disfarce de Herodes pretendesses que eu ficasse ofendido... Mas pareces ignorar que por pior que fosse o disfarce com o qual me quisesses conotar ele não passaria disso mesmo... um disfarce de Carnaval. Tristes são aqueles que não precisam do Carnaval para vestir a pele de Herodes (ou outras piores), e passam o ano inteiro a comportar-se como tal.... Já agora deixa-me sugerir-te um disfarce também: Colocas umas orelhas de abano, um bigodinho seboso e levas debaixo do braço a colecção completa de 100 DVD's com os melhores erros dos árbitros a favor do benfica (com prólogo narrado por Inocêncio Calabote) e já podes saír à rua disfarçado de Luís Filipe Vieira...
Jorge Lourenço