No início do seu segundo mandato como Presidente da República, Jorge Sampaio considerou-a imprescindível para o desenvolvimento da democracia. A ANMP exige-a. A ANAFRE reclama-a. Com mais ou menos destaque, todos os partidos políticos a elegem como uma prioridade. Os programa dos sucessivos Governos classificam-na como fundamental. É ela a DESCENTRALIZAÇÃO! O rosto de uma profunda mudança no desenho dos limites geográficos internos do país, que uns dizem ser o bastante, e outros clamam que deve ir até à autonomia prevista na Constituição com a criação das regiões administrativas.
Com tanta gente a dar-lhe importância, esperava-se que a reforma territorial da nossa Administração Pública fosse, finalmente, implementada... sem tabus e de uma forma estruturada. Mas a «revolução tranquila» prometida pelo XV Governo ficou muito aquém das promessas eleitoralistas do PSD. As medidas descentralizadoras consubstanciadas, nomeadamente, nas Leis 10 e 11/2003, de 13 de Maio, mais do que unir (como pomposamente se apregoava em oposição às consequências da regionalização), têm dividido os autarcas e esqueceram que, enquanto o Distrito se mantiver como divisão administrativa, há que incluir a questão das Assembleias Distritais na agenda política, e ter a coragem de assumir uma posição concreta, e urgente, sobre o seu enquadramento futuro.
Porque estas entidades existem! E mesmo que alguns autarcas as classifiquem como “órgãos inúteis”, o certo é que são várias as que desenvolvem actividades de méritos reconhecidos, em particular na área sócio-cultural, como sejam: as Colónias Balneares na Areia Branca e na Nazaré, das Assembleias Distritais de Castelo Branco e de Santarém; o Museu Rainha D. Leonor, da Assembleia Distrital de Beja; o Museu Regional do Algarve, da Assembleia Distrital de Faro; o Museu de Arqueologia e Etnografia, da Assembleia Distrital de Setúbal, e os Serviços de Cultura (Biblioteca Pública, Sector Editorial e Núcleo de Investigação Arqueológica) da Assembleia Distrital de Lisboa.
O «novo modelo de governação» prometido pelo XV Governo e continuado pelo fátuo XVI Governo, assentava, em termos de administração territorial, em reformas que tinham a descentralização como «pano de fundo», mas ficou-se apenas por decisões legislativas ao nível do reforço das atribuições e competências das Associações de Municípios, da criação de novas Áreas Metropolitanas e da transferência de parte das competências dos Governos Civis para o plano municipal. Medidas estas que, além de contribuírem para desfragmentar ainda mais o já de si pouco ordenado recorte geográfico da nossa administração pública (desde os órgãos desconcentrados do Estado que adoptam áreas de intervenção diversificadas, aos distritos, concelhos e freguesias, ou às unidades para fins estatísticos – as NUTS, existem dezenas de divisões administrativas do país que se sobrepõem, mostrando um país confuso, com um figurino territorial interno completamente desorganizado), denunciam uma despreocupação total pelos interesses reais das populações na medida em que o carácter avulso, não coordenado, sem visão de conjunto e não integrativo de soluções anteriores, acaba por ter custos económicos, além de sociais e culturais, que serão os contribuintes a suportar.
Evidente se torna, também, a falta de vontade política de todos os partidos com assento parlamentar, em extinguir, efectivamente, a controversa figura do Distrito, mesmo aqueles que se dizem acérrimos defensores dessa opção, na medida em que evitam passar à prática as suas «teorias de gabinete», não fossem elas acabar por ser aprovadas, o que seria muito inconveniente sobretudo enquanto se mantiver a actual lei eleitoral, cuja base de organização é distrital. E ao omitirem o caso das Assembleias Distritais na discussão das matérias referentes à descentralização, agindo como se elas já tivessem sido extintas, demonstram uma total falta de ética, por isso, enquanto o Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de Janeiro se mantiver em vigor, e o texto constitucional não for alterado, o mínimo que se exige ao Governo e aos edis municipais, tal como o Estado exige aos cidadãos em geral, é o cumprimento da legislação, e o respeito pelos trabalhadores afectos aos Serviços que estão adstritos àquelas entidades, porque a difícil situação em que se encontram estas estruturas é, apenas, o reflexo do ostracismo a que os políticos (de todos os partidos – deputados, governantes e autarcas) as têm condenado e não o resultado do comportamento dos seus funcionários os quais têm sido, aliás, os únicos a pugnar pelo esclarecimento integral da situação.
Resumindo, para resolver o impasse em que se encontram as Assembleias Distritais há que ter noção de quais são, efectivamente, as limitações que condicionam a apresentação de resultados, porque só percebendo o que se passa é possível ultrapassar os obstáculos e ir em frente. Pelas consequências materiais (recursos financeiros escassos) e humanas (incentivos profissionais inexistentes) que lhes estão associadas podemos, então, identificar três tipos de factores:
Legais – progressivo esvaziamento funcional das assembleias distritais, nomeadamente a partir de 1987, e a manutenção de um regime jurídico transitório e desfasado da situação real (Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de Janeiro);
Económicos – dependência orçamental de uma única fonte de receita (as transferências municipais), o que origina frequentes problemas de liquidez de tesouraria quando as Câmaras não procedem ao pagamento atempado das suas contribuições;
Políticos – dificuldades em reunir o órgão deliberativo, devido ao crescente desinteresse dos autarcas pelo funcionamento dos Serviços, em particular após a implementação do novo modelo de organização territorial (Leis n.os 10 e 11/2003, de 13 de Maio).
Que se faça, pois, a «revolução», assuma ela a expressão defendida pelos adeptos da REGIONALIZAÇÃO, entre os quais a autora deste texto se inclui, ou que se fique pela forma mais simples da DESCENTRALIZAÇÃO, que necessita de muitos e vastos acertos de pormenor, mas que ela seja, efectivamente, «tranquila» e, sobretudo, que o próximo Governo encontre uma forma rápida (mas não superficial), equilibrada e justa, de o fazer... para que, mais uma vez, não sejam os trabalhadores das Assembleias Distritais, além de ignorados e esquecidos, a suportar os custos da incongruência legislativa. ET
Com tanta gente a dar-lhe importância, esperava-se que a reforma territorial da nossa Administração Pública fosse, finalmente, implementada... sem tabus e de uma forma estruturada. Mas a «revolução tranquila» prometida pelo XV Governo ficou muito aquém das promessas eleitoralistas do PSD. As medidas descentralizadoras consubstanciadas, nomeadamente, nas Leis 10 e 11/2003, de 13 de Maio, mais do que unir (como pomposamente se apregoava em oposição às consequências da regionalização), têm dividido os autarcas e esqueceram que, enquanto o Distrito se mantiver como divisão administrativa, há que incluir a questão das Assembleias Distritais na agenda política, e ter a coragem de assumir uma posição concreta, e urgente, sobre o seu enquadramento futuro.
Porque estas entidades existem! E mesmo que alguns autarcas as classifiquem como “órgãos inúteis”, o certo é que são várias as que desenvolvem actividades de méritos reconhecidos, em particular na área sócio-cultural, como sejam: as Colónias Balneares na Areia Branca e na Nazaré, das Assembleias Distritais de Castelo Branco e de Santarém; o Museu Rainha D. Leonor, da Assembleia Distrital de Beja; o Museu Regional do Algarve, da Assembleia Distrital de Faro; o Museu de Arqueologia e Etnografia, da Assembleia Distrital de Setúbal, e os Serviços de Cultura (Biblioteca Pública, Sector Editorial e Núcleo de Investigação Arqueológica) da Assembleia Distrital de Lisboa.
O «novo modelo de governação» prometido pelo XV Governo e continuado pelo fátuo XVI Governo, assentava, em termos de administração territorial, em reformas que tinham a descentralização como «pano de fundo», mas ficou-se apenas por decisões legislativas ao nível do reforço das atribuições e competências das Associações de Municípios, da criação de novas Áreas Metropolitanas e da transferência de parte das competências dos Governos Civis para o plano municipal. Medidas estas que, além de contribuírem para desfragmentar ainda mais o já de si pouco ordenado recorte geográfico da nossa administração pública (desde os órgãos desconcentrados do Estado que adoptam áreas de intervenção diversificadas, aos distritos, concelhos e freguesias, ou às unidades para fins estatísticos – as NUTS, existem dezenas de divisões administrativas do país que se sobrepõem, mostrando um país confuso, com um figurino territorial interno completamente desorganizado), denunciam uma despreocupação total pelos interesses reais das populações na medida em que o carácter avulso, não coordenado, sem visão de conjunto e não integrativo de soluções anteriores, acaba por ter custos económicos, além de sociais e culturais, que serão os contribuintes a suportar.
Evidente se torna, também, a falta de vontade política de todos os partidos com assento parlamentar, em extinguir, efectivamente, a controversa figura do Distrito, mesmo aqueles que se dizem acérrimos defensores dessa opção, na medida em que evitam passar à prática as suas «teorias de gabinete», não fossem elas acabar por ser aprovadas, o que seria muito inconveniente sobretudo enquanto se mantiver a actual lei eleitoral, cuja base de organização é distrital. E ao omitirem o caso das Assembleias Distritais na discussão das matérias referentes à descentralização, agindo como se elas já tivessem sido extintas, demonstram uma total falta de ética, por isso, enquanto o Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de Janeiro se mantiver em vigor, e o texto constitucional não for alterado, o mínimo que se exige ao Governo e aos edis municipais, tal como o Estado exige aos cidadãos em geral, é o cumprimento da legislação, e o respeito pelos trabalhadores afectos aos Serviços que estão adstritos àquelas entidades, porque a difícil situação em que se encontram estas estruturas é, apenas, o reflexo do ostracismo a que os políticos (de todos os partidos – deputados, governantes e autarcas) as têm condenado e não o resultado do comportamento dos seus funcionários os quais têm sido, aliás, os únicos a pugnar pelo esclarecimento integral da situação.
Resumindo, para resolver o impasse em que se encontram as Assembleias Distritais há que ter noção de quais são, efectivamente, as limitações que condicionam a apresentação de resultados, porque só percebendo o que se passa é possível ultrapassar os obstáculos e ir em frente. Pelas consequências materiais (recursos financeiros escassos) e humanas (incentivos profissionais inexistentes) que lhes estão associadas podemos, então, identificar três tipos de factores:
Legais – progressivo esvaziamento funcional das assembleias distritais, nomeadamente a partir de 1987, e a manutenção de um regime jurídico transitório e desfasado da situação real (Decreto-Lei n.º 5/91, de 8 de Janeiro);
Económicos – dependência orçamental de uma única fonte de receita (as transferências municipais), o que origina frequentes problemas de liquidez de tesouraria quando as Câmaras não procedem ao pagamento atempado das suas contribuições;
Políticos – dificuldades em reunir o órgão deliberativo, devido ao crescente desinteresse dos autarcas pelo funcionamento dos Serviços, em particular após a implementação do novo modelo de organização territorial (Leis n.os 10 e 11/2003, de 13 de Maio).
Que se faça, pois, a «revolução», assuma ela a expressão defendida pelos adeptos da REGIONALIZAÇÃO, entre os quais a autora deste texto se inclui, ou que se fique pela forma mais simples da DESCENTRALIZAÇÃO, que necessita de muitos e vastos acertos de pormenor, mas que ela seja, efectivamente, «tranquila» e, sobretudo, que o próximo Governo encontre uma forma rápida (mas não superficial), equilibrada e justa, de o fazer... para que, mais uma vez, não sejam os trabalhadores das Assembleias Distritais, além de ignorados e esquecidos, a suportar os custos da incongruência legislativa. ET
3 comentários:
Não percebo qual o papel das Assembleias Distritais.Com que objectivos são formadas e por quem?Ag
Para Agostinho: as Assembleias Distritais são órgãos deliberativos da Administração Pública Local, compostos exclusivamente por autarcas (os presidentes de todas as Câmaras e Assembleias Municipais do distrito e um presidente de Junta de Freguesia por concelho, eleito na respectiva AM). Segundo o texto constitucional, as AD serão extintas após a instituição, em concreto, das regiões administrativas. Devido à escassez de recursos (técnicos, humanos e financeiros), do leque de atribuições definidas no DL 5/91, de 8-1, têm vindo a ser desenvolvidas apenas as actividades na área da cultura (Beja, Faro, Lisboa e Setúbal) e do apoio social (Castelo Branco e Santarém), conforme explico no artigo precedente e no post «Assembleias Distritais... sabia que?», publicado neste blog no dia 07/12/2004. Porto, Vila Real e Viseu resta-lhes os serviços administrativos. As outras 9 estão inactivas. ET
Para Micróbio: talvez não tenha sido essa a tua intenção, mas essa dos resíduos fez-me pensar naquilo em que se transformou o Distrito... um incómodo detrito do passado que todos querem esquecer, mas cuja morte ninguém tem coragem de assumir. Por isso, a sua revitalização é algo que, embora já tenha sido uma opção pensada, é uma proposta sem futuro dado o desinteresse cobarde com que os políticos (de todos os quadrantes políticos) olham para o problema. Aliás, as AD vão-se mantendo apenas porque a lei eleitoral se organiza com base nos círculos distritais, os quais muito dificilmente se extinguirão devido aos lobbies partidários que neles operam. ET
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